«O velho monge estava
sentado, respirando calmamente. Entretanto apareceu um dos seus discípulos
acompanhado por um estranho. Este, apresentando –se como sendo um homem de
negócios começou a falar, ininterruptamente, dos seus projectos, do seu sucesso
…
A certa altura, com um olhar afectuoso e cheio de compreensão, o velho monge
decide interrompê-lo:
-"De que tens medo?"...
Apanhado de surpresa o homem parou, questionando-se sobre tão inusitada
pergunta:
- "Medo?... medo de quê?"… pensou, olhando para o velho monge, cujos
olhos pareciam animá-lo a olhar para dentro de si mesmo, a fazer uma
introspecção. Afinal, não corria risco algum…
Começou a reflectir. "É verdade que desde há já muito tempo não fazia
outra coisa senão falar de si próprio e dos seus negócios… até já tinha sido
chamado à atenção por causa disso"…
De repente, à mesma velocidade com que o vento leva as nuvens, tudo se tornou
mais claro … "se passava o tempo a falar… era para se não sentir só… Ele
tinha medo da solidão!...
Até esse momento, tinha passado o seu tempo a falar, de tudo e de nada…"
O monge continuava a olhá-lo afectuosamente… "É verdade que nunca tinha
gozado o tempo que passava, os acontecimentos, a sua vida, enfim!... Passou o
tempo a projectar, procurar dar provas, falar… nunca se permitiu viver o
instante."*
O monge sorria deixando o olhar espraiar-se pela paisagem. Parecia querer dizer
"sim … é isso mesmo" … O homem, então, sentou-se ao lado do monge e,
pela primeira vez, escutou.
O vento nas árvores, o canto dos pássaros, a erva a dançar, o sol que o
aquecia, a sua respiração, escutou o silêncio...
Ele que tinha passado o tempo a falar, sem ouvir. Falar para não ter que ouvir
… ouvir os seus medos, a sua tristeza, as suas dúvidas, o seu sofrimento
e surdo para as dúvidas, os medos, a tristeza, o sofrimento de todos os
que lhe eram próximos e com quem convivia. Pouco a pouco e sem se aperceber,
tinha-se deixado enclausurar numa parede de palavras.
Este medo da solidão ficou soterrado sob uma avalanche de palavras.
Com o olhar virado para a floresta, uma lágrima provocou uma fissura naquela
parede e começou a chorar.
O velho monge acolheu, assim, aquele que tinha estado enclausurado durante
tanto tempo.
- "Sê bem vindo, meu amigo".E ali ficaram os dois homens, em silêncio, quase até ao anoitecer …»
Contes philosophiques
Trad/adap.
Maria M. Abreu